sexta-feira, janeiro 10, 2014

Copy & Paste


Quantas vezes nos deparámos com uma notícia escrita com as mesmas palavras, em jornais diferentes? Por vezes aquilo que ouvimos na rádio ou televisão é descrito exatamente como tínhamos lido no jornal ou, numa simples busca na Internet, encontramos o mesmo texto em diversas páginas de informação. Poderíamos dizer que "há coincidências", mas não.

O Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas emitiu, por estes dias, uma recomendação onde apela aos leitores e jornalistas para a vigilância e denúncia de plágios em jornais e outros órgãos de comunicação social. No comunicado que difundiu, o Conselho Deontológico diz ter constatado "a existência de trabalhos inspirados em artigos de outras publicações, alguns deles com excertos exatamente com as mesmas palavras". Tais práticas, sublinha, constituem uma "grave falta profissional de natureza ético-deontológica".

As novas tecnologias revolucionaram a escrita e a edição da informação. Quando antes era preciso consultar numerosos papéis, anotá-los e sublinhá-los para depois escrever – numa folha em branco – uma síntese do que se leu, agora é mais fácil colocar tudo num só documento e depois ir apagando até ficar com o essencial. A diferença é que, no primeiro caso, é mais cómodo utilizar palavras nossas para descrever o que lemos, enquanto na segunda situação basta fazer as ligações entre os "pedaços" que se pretendem juntar. O resultado é que este processo simplifica a cópia de originais para criar um novo conteúdo.

Por outro lado as redações, cada vez mais com trabalho precário e pouco qualificado, começaram a aceitar com naturalidade que os textos das agências poderiam ser copiados e publicados sem edição, e muitas vezes até sem referir o seu autor. Ainda que o serviço da agência seja pago, as peças jornalísticas produzidas têm uma autoria e esse crédito deve ser atribuído, sobretudo quando o texto é reproduzido na sua totalidade.

Há órgãos de comunicação social que não têm recursos humanos e financeiros para fazer reportagens "ao fundo a rua" mas que conseguem acompanhar acontecimentos "do outro lado do mundo", simplesmente porque a Internet trouxe o mundo até eles. Um leitor atento dos media consegue encontrar notícias do New York Times, Guardian, Le Monde ou El País na imprensa nacional dos dias seguintes. Por vezes com as mesmas palavras. Isso é mais evidente quanto a notícia se enquadra nos chamados "faits-divers", talvez por merecerem um tratamento apressado, ou por estarem a cargo de jornalistas menos qualificados.

Plágio não é apenas copiar um texto de outro autor, eventualmente traduzindo-o e acrescentando ou retirando alguns parágrafos. Plágio é também copiar a notícia que foi publicada noutro órgão de comunicação social, e ainda que ela seja totalmente reescrita não deixa de ser do jornal – e jornalista – que a publicou. Porém, a naturalidade com que, nas redações, se aceita que tudo o que está na Internet é público, leva muitos jornalistas a colher informações em jornais internacionais, blogues e até comentários nas redes sociais, muitas vezes sem o conhecimento e autorização dos seus autores, por vezes sem verificar os factos ou confirmar as fontes.

A cópia não prejudica apenas os autores dos originais, ou os órgãos de comunicação social que investiram na recolha de informação. Prejudica também o público e os jornalistas dos media em que foram divulgados e prejudica sobretudo a liberdade de expressão. Os manipuladores da informação sabem que as redações que se acomodam e aceitam o plágio sem contestar, também irão aceitar sem alterações as notícias – prontas – que os assessores lhes forem entregar.

Por isto, a recomendação do Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas é oportuna. Dirão muitos que "não muda nada", eu digo que depende de todos nós. Se formos exigentes, enquanto leitores e enquanto profissionais, podemos mudar a forma como os nossos filhos vão ver o mundo.




Publicado em Setúbal na Rede a 06-01-2014