quarta-feira, maio 02, 2012

Bad news is good news?


É costume dizer-se que, para um jornalista, uma má notícia é sempre uma boa notícia.

Não é preciso esperar por terramotos e outras grandes tragédias para encontrar “más notícias” nos jornais. Numa pesquisa rápida pela imprensa de hoje encontramos, sem grande esforço, notícias de homicídios, assaltos ou violações. Até mesmo as revistas “cor-de-rosa” deixaram de lado o glamour das purpurinas e lantejoulas para se dedicarem aos abandonos, agressões e outros dramas das figuras do jet-set televisivo. Mas não se pense que as “más notícias” são um exclusivo da chamada “imprensa menor”. Também a “imprensa séria” enche as suas páginas com escândalos de corrupção, derrapagens financeiras e desvios de fundos.

As notícias que refletem o pior da humanidade – muito mais até que as catástrofes da natureza – estão por todo o lado e “pintam” um futuro cinzento que nos aponta o caminho para o abismo. Esta visão preocupa os políticos, de tal forma que alguns surgem a terreiro responsabilizando os jornalistas pelo “estado de depressão” nacional. Todavia, aqueles que culpam o mensageiro pelo teor da mensagem são os mesmos que, quando lhes convém, adaptam o seu discurso à carga negativa que lhes garante um lugar no noticiário nacional.

Generalizando, podemos dizer que em Portugal faz-se muito bem a crónica do que está mal.

Cavaco Silva, no seu discurso nas cerimónias parlamentares do 38.º Aniversário do 25 de Abril, exortou os portugueses – e indiretamente os media – a serem arautos dos sucessos nacionais sob pena de desmobilizarem os cidadãos e de prejudicarem a expectativa dos agentes económicos. Para o Presidente é altura para falar e comentar boas notícias para ajudar a promover a imagem de Portugal no exterior.

A ideia de divulgar “boas notícias” não é nova. Já houve várias tentativas de criação de órgãos de comunicação social especializados neste tipo de informação e as revistas que ocasionalmente são publicadas por ministérios e autarquias, refletem esse mundo perfeito onde todas as fotos mostram pessoas felizes. Aliás, os governos são grandes produtores de “boas notícias”. Infelizmente, nem as notícias veiculadas pelos governos convencem, nem os medias especializados num mundo feliz tiveram grande sucesso.

Isso quer dizer que “as más notícias não vendem”?

Não necessariamente. Se relermos atentamente o discurso de Cavaco Silva descobriremos que os exemplos de sucesso nacional, apontados pelo Presidente, já foram noticiados no passado – até em grande medida pelo governo anterior – e se olharmos com atenção para os jornais de hoje encontraremos, certamente, notícias positivas ao lado das negativas. Ambas estão presentes, mas talvez se dê mais valor a umas do que a outras.

O jornalista é o polícia da sociedade. E, tal como numa operação stop para controlo de automobilistas a conduzir sob o efeito do álcool, o que se regista são as infrações. O que sai da normalidade. No caso dos condutores, espera-se que não conduzam alcoolizados. Portanto, se em 100 automobilistas controlados, para 98 o teste tenha um resultado negativo é aos dois restantes que se vai escrever o auto de notícia, com o valor da coima. Para o jornalismo a notícia também é assim. Tem um valor. É certo que também se podia escrever “a maioria dos automobilistas não bebe quando conduz”, mas não era a mesma coisa, pois não?

(Publicado em Setúbal na Rede 02/05/2012)


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