segunda-feira, julho 21, 2025

Jornalismo | Mediar ou Opinar?

 

Há uma frase que costumo repetir sobre a minha profissão: os jornalistas sabem quase nada de quase tudo. Longe de ser uma autocrítica, é uma constatação sóbria da natureza paradoxal do ofício: exige-se ao jornalista que trate, com clareza e urgência, temas que especialistas levam décadas a dominar. Essa condição não é uma falha — é parte da sua utilidade pública. Mas também exige que o jornalista saiba onde começa o seu limite.

O problema começa quando essa consciência se perde — e o que era um exercício de mediação se transforma num palco de opinião. Refiro-me ao fenómeno do jornalista-comentador, cada vez mais presente nos espaços de rádio e televisão, que discorre com igual convicção sobre finanças públicas e geopolítica, decisões judiciais e estratégias de saúde, política externa e política educativa. A figura que deveria facilitar o entendimento transforma-se num emissor de certezas.

Mesmo nos casos — poucos — em que o jornalista possui formação académica ou experiência prolongada numa área específica, o seu papel não é o de perito. O jornalista serve a compreensão pública, não a legitimação de teses. O seu dever é esclarecer, contextualizar e apresentar diferentes vozes. Confundir este papel com o de especialista é, além de imprudente, um risco para a qualidade do debate democrático.

Walter Lippmann, um dos teóricos fundadores do jornalismo moderno, já advertia para o perigo dos pseudoambientes — simplificações inevitáveis que permitem ao público interpretar um mundo demasiado complexo para ser conhecido diretamente. Mas Lippmann alertava também que, se o filtro jornalístico abdicar do rigor e ceder à dramatização ou à velocidade, torna-se instrumento de manipulação e não de esclarecimento.

É tentador opinar. Requer menos trabalho do que explicar. Exige menos escuta e mais protagonismo. Mas é justamente esse protagonismo que deve ser combatido. Quando o jornalista se coloca no centro do palco e abandona a mediação, deixa de cumprir a sua função essencial: ser uma ponte entre o conhecimento e o cidadão.

Num tempo em que a desinformação e o ruído competem com a verdade, o jornalismo não precisa de mais opinião travestida de análise. Precisa de mais humildade, mais escuta e mais compromisso com a transparência. Mesmo sabendo quase nada de quase tudo, o jornalista pode — e deve — continuar a ser útil, desde que reconheça que a sua força está, precisamente, na honestidade desse limite.

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